Uma técnica de arte em
desenho existente há quase 50 anos, o grafite esbanja diversão, impressiona e “freia”
a correria da vida urbana.
Por DANIELE MENDES
DE MELO da ASCOM PML,
em Lages/SC
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📷 Nilton Wolff / Divulgação |
Os desenhos parecem
ganhar movimento e o colorido nas paredes fascina os olhos. A imaginação
derruba barreiras e corre solta. Estes são os fenômenos emocionais causados
pela arte do grafite (grafitismo), uma manifestação em espaços públicos vista
ao ar livre, intimamente ligada a vários movimentos, em especial ao hip hop. Em Lages, as
passarelas que dão acesso para os pedestres aos lados opostos da avenida
Belizário Ramos, sobre o rio que corta considerável parte do perímetro urbano
do município, estão se transformando, de simples monumentos de mobilidade
sérios e despercebidos, em criações divertidas e simpáticas tanto para os
pedestres que utilizam este dispositivo, quanto para os motoristas da via.
Pelas mãos do grafiteiro
lageano, Everton de Oliveira Figueiró, 36 anos, casado, sem filhos, as pontes
para pedestres estão se tornando amplas murais de valorização dos elementos
pertinentes à Serra Catarinense. Impossível passar pelo local e não dar aquela
“espiadinha”. Ele aceitou o convite do vice-prefeito Juliano Polese para
embelezar os 11 pontos de passarelas espalhadas pelos mais diversos pontos da
avenida Carahá. “Vi uma grafitagem desta em uma das viagens que fiz e achei
interessante. Alguns dias atrás, quando assumi a prefeitura, tentei colocar em
prática. E visualizei o nome do Everton na Revista Serrana em uma matéria. E
deu certo. Acertamos um valor que está sendo pago pela iniciativa privada, de
algumas parcerias. Teremos um visual diferenciado e as passarelas serão deste
modo recuperadas, dando uma alegria maior a nossa cidade e incentivando a arte
ao proporcionar algo diferente que irá chamar a atenção”, salienta Polese. O
artista Everton estima que em um mês todas as passagens elevadas estejam com
suas grafitagens concluídas.
O desafio começou na passarela
próximo ao Supermercado Martendal, sentido Triângulo - Centro. “Inclusive,
ontem (quinta-feira), quando estava pintando ali o desenho de uma curicaca
(curucaca), não é que tinha uma ali pertinho de mim, servindo de pura
inspiração? Paisagem, animais, rio e pinheiro são reproduzidos na parte de
fora. Na de dentro há peixes, como o cará, espécie típica”, descreve Everton.
Com estilo despojado,
composto por camiseta e bermuda escuras, de boné e tênis, o cara com “pinta” de
adolescente, confessa sua sensibilidade com os traços sutis em verdadeiras
obras formadas pelo amanhecer e por do Sol, rios, lagos, montanhas de serra,
pinheiros araucárias, gralhas azuis, curucacas. Não é à toa que sua percepção
de mundo e de respeito às características geográficas, climáticas e de fauna e
flora regionais prometem encantar os lageanos e visitantes. “Todas as técnicas
são bem exploradas. Meu desejo é que o trabalho fique o mais bonito possível.
O spray dá
efeitos que o pincel não alcança e vice-versa. É gostoso de fazer e de
admirar.”
Alma de jovem
Artista plástico há 20
anos, Everton, autodidata, tem como profissão o grafite, além de artes em
geral, como a pintura, aerografia e decoração de ambientes, em uma carreira que
dá para se dizer solitária, já que se concentra mentalmente e faz o que tem de
fazer sozinho. Seus únicos companheiros nesta empreitada são os tubos de spray, tinta acrílica e
esmalte, rolo, pincel, compressor, aerógrafo e pistola. Normalmente, não há
um crew -
conjunto de grafiteiros que se reúnem para pintar ao mesmo tempo. Um trabalho
admirado pelo lageano é o de Daim, artista alemão de grafite, conhecido por
suas obras de grafite de grande porte em estilo 3D. Carrega a reputação de ser
um dos melhores grafiteiros do mundo por seu estilo tecnicamente sofisticado.
E assim como quase todo
guri, ele arriscava seus primeiros rabiscos de forma modesta. “Eu comecei com
16 anos. Desenhava nos cadernos, em todo lugar. Gosto de representar paisagens,
é como uma marca registrada do meu trabalho, sempre vai ter. Hoje consigo viver
da arte”, explica o grafiteiro, que estudou Artes Visuais até a metade do curso
de graduação na Universidade do Planalto Catarinense (Uniplac), porém já fazia
pintura anteriormente e a vontade de voltar a estudar e concluir é latente.
Everton não sabe explicar
ao certo o porquê se tornou um grafiteiro, mas o amor ao desenho é evidente e
cadencia o andar da carruagem no seu ofício, pois todo começo é tímido e tem
relação com o que se faz atualmente. “Foi algo que aconteceu automaticamente,
de repente me vi pintando na rua. Participei de alguns murais aqui em Lages há
bastante tempo, como num evento em 2000, quando pintei a Biblioteca Pública
Municipal. No ano anterior, em 1999, pintei o colégio onde estudei tempos
atrás, o Lúcia Fernandes Lopes. Tenho uma bela caminhada”, celebra o artista.
Para visualizar mais do
seu trabalho enquanto as passarelas não ficam todas protas, vários locais da
cidade já têm seu grafite estampado, a exemplo de uma loja de skate nos fundos da
loja Zago, além da Academia Magistral, Escola de Educação Básica (E.E.B.) Vidal
Ramos e o Centro de Educação Profissional (Cedup) Renato Ramos da Silva.
Arte urbana de quase 50 anos
Em relação ao grafitismo
em si, existem vestígios de sua existência desde o Império Romano. Na Idade
Contemporânea, seu surgimento aconteceu na década de 1970, em Nova Iorque
(Estados Unidos - EUA). No Brasil foi introduzido no final da década de 1970,
em São Paulo. Com a incrementação de técnicas e a evolução na criatividade, o
estilo do grafite brasileiro é reconhecido entre os melhores do mundo.
Alguns termos e gírias
são grafiteiro/writter (o artista que
pinta); bite (imitar o estilo
de outro grafiteiro); crew (conjunto de
grafiteiros que se reúne para pintar ao mesmo tempo); tag (assinatura de grafiteiro); toy (grafiteiro iniciante),
e spot (lugar
onde é praticada a arte do grafitismo).