A denúncia aponta
indícios de crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro e
interceptação telefônica ilegal.
Por FELIPE PONTES
da AGÊNCIA BRASIL,
Brasília/DF
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📷 Marcos Oliveira / Agência Senado |
O Ministério Público
Federal (MPF) apresentou hoje (21) à Justiça Federal denúncia contra sete
pessoas, incluindo o jornalista norte-americano Glenn Greenwald, responsável
pelo site The
Intercept Brasil, no âmbito da Operação Spoofing, que apura a invasão de
celulares de autoridades. São apontados indícios dos crimes de organização
criminosa, lavagem de dinheiro e interceptação telefônica ilegal.
Segundo a denúncia,
assinada pelo procurador da República Wellington Divino de Oliveira, Greenwald
teria auxiliado, orientado e incentivado as atividades criminosas do grupo. O
teor da denúncia está na página do MPF, na
internet.
O jornalista não chegou a
ser investigado pela Polícia Federal (PF). Uma liminar (decisão
provisória) concedida em agosto do
ano passado pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF),
determinou que Greenwald não fosse investigado ou responsabilizado por receber,
obter ou publicar informações de interesse jornalístico. O pedido de liminar
havia sido feito pelo partido Rede Sustentabilidade. Desde junho do ano
passado, o Intercept tem publicado mensagens trocadas por autoridades da
República. Glenn afirma ter obtido o material de uma fonte anônima.
Denúncia
Na denúncia, o procurador
Divino de Oliveira ressalta que, em respeito a tal decisão, não houve
investigação contra Greenwald, mas que ainda assim resolveu denunciá-lo, após
ter sido encontrado em um computador na casa de Luiz Henrique Molição, acusado
de ser um dos hackers invasores
de celulares de autoridades, um áudio em que o jornalista orienta a destruição
de mensagens, segundo a acusação.
A orientação para que
mensagens que ligavam os hackers ao
Intercept fossem apagadas teria sido dada por Greenwald depois das primeiras
notícias sobre a invasão do celular do ministro da Justiça e Segurança Pública,
Sergio Moro, diz a denúncia. Para Divino de Oliveira, isso caracterizaria
"clara conduta de participação auxiliar no delito, buscando subverter a
ideia de proteção à fonte jornalística em uma imunidade para orientação de
criminosos”.
O procurador diz entender
não ser crime somente a publicação do material obtido de forma ilícita, mas
argumenta que Greenwald teria ido além ao orientar sobre como dificultar a
investigação dos crimes. O MPF informou que a denúncia foi encaminhada à
Procuradoria-Geral da República (PGR) para eventual pedido para que seja
revogada a liminar do Supremo que impede o jornalista de ser investigado.
Além de Greenwald e
Molição, foram denunciados: Walter Delgatti Netto e Thiago Eliezer Martins
Santos, apontados como mentores e líderes do grupo; Danilo Cristiano Marques,
acusado de ser testa de ferro de Delgatti na obtenção de materiais para o
cometimento dos crimes; o programador Gustavo Henrique Elias Santos, que teria
desenvolvido as técnicas para a invasão dos celulares de autoridades; e Suelen
Oliveira, esposa de Gustavo que teria atuado como laranja.
Fraude bancária
O grupo ainda deve ser
alvo de outra denúncia pelo crime de fraude bancária, que ainda segue em
investigação, de acordo com o MPF.
A denúncia apresentada
nesta terça-feira (21) à 10ª Vara Federal de Brasília diz ter ficado provada a
ocorrência de 126 interceptações telefônicas, telemáticas ou de informática e
176 invasões de dispositivos informáticos de terceiros, resultando na obtenção
de informações sigilosas. Entre os envolvidos, somente Greenwald não foi
acusado pelo crime de lavagem de dinheiro.
Defesa
A defesa do jornalista
Greenwald disse, em nota, que recebeu a informação sobre a denúncia "com
perplexidade". "Trata-se de um expediente tosco que visa desrespeitar
a autoridade da medida cautelar concedida na Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental (ADPF) nº 601, do Supremo Tribunal Federal, para além de
ferir a liberdade de imprensa e servir como instrumento de disputa
política", diz a nota, ao citar a liminar de Gilmar Mendes.
Para os advogados Rafael
Borges e Rafael Fagundes, o objetivo da denúncia "é depreciar o trabalho
jornalístico de divulgação de mensagens realizado pela equipe do The Intercept
Brasil". A defesa também diz que vai recorrer da decisão e pedir apoio à
Associação Brasileira de Imprensa.
Em nota, a defesa de
Walter Delgatti Neto, Gustavo Henrique Elias Santos e Suelen
Oliveira afirma que a denúncia apresentada pelo procurador confirma que as
acusações "são de cunho político, desprovidas de qualquer embasamento
técnico". Para o advogado Ariovaldo Moreira, que assina o texto, a
denúncia desrespeita diversas garantias constitucionais e legais.
A Agência Brasil tenta
contato com demais envolvidos e suas defesas e está aberta às suas
manifestações.
Repercussão
Durante a tarde, o
presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, usou o Twitter para
classificar a denúncia contra Greenwald como uma ameaça à liberdade de
imprensa. "Jornalismo não é crime. Sem jornalismo livre não há
democracia", disse Maia.
A Federação Nacional dos
Jornalistas (Fenaj) também divulgou nota após a denúncia do procurador. Para a
federação "o MPF ignora a Constituição Brasileira, que assegura a
liberdade de imprensa. Ignora também decisão de 2019 do Supremo Tribunal
Federal (STF) que determinou que o jornalista não fosse investigado no âmbito
da Operação Spoofing, da Polícia Federal, destinada a investigar invasões de
celulares de autoridades".