MPF abre inquérito sobre portaria do MEC
Para especialistas,
revogação tem caráter “simbólico”.
Por GILBERTO COSTA
da AGÊNCIA BRASIL,
Brasília/DF
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📷 Marcello Casal Jr. / Agência Brasil |
A Procuradoria Regional
dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal (MPF), no Rio de janeiro,
vai apurar a legalidade da Portaria do
Ministério da Educação nº 45, de 16 de junho de 2020,
publicada hoje (18) no Diário
Oficial da União.
O ato do MEC, ainda
assinado pelo então ministro Abraham Weintraub, revoga a Portaria nº 13/2016, que
estabelecia a necessidade de criação, naquele ano, de políticas afirmativas nos
cursos de pós-graduação. A portaria de 2016 estabelecia, que, em um prazo de 90
dias, as instituições federais de ensino superior deveriam apresentar propostas
sobre inclusão de negros, indígenas e pessoas com deficiência em seus programas
de pós-graduação (mestrado, mestrado profissional e doutorado), como políticas
de ações afirmativas.
A portaria original ainda
previa que Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)
elaborasse censo discente da pós-graduação, para verificar o perfil dos alunos,
e fosse criado um grupo de trabalho dentro do MEC para acompanhar a implantação
das ações previstas na portaria.
Em nota à Agência Brasil, o
Ministério da Educação assinala que a Portaria nº 13/2016 “foi revogada com
base no artigo 8º, do Decreto nº 10.139/2019”, que obriga a anulação de normas
“cujos efeitos tenham se exaurido no tempo”. Na nota, o MEC acrescenta que
a Lei nº 12.711/2012, em
vigor, prevê a concessão de cotas e ações afirmativas exclusivamente para
cursos de graduação.
De acordo com o IBGE, os
estudantes negros (pretos e pardos) são maioria nas instituições de ensino
superior federais, estaduais e/ou municipais. Conforme os dados da pesquisa
Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no BrasilUniversidade de, divulgada no
ano passado, o Brasil tinha mais de 1,14 milhão de estudantes autodeclarados
pretos e pardos em 2018, enquanto os brancos ocupavam 1,05 milhão de vagas,
respectivamente, 50,3% e 48,2% dos matriculados na rede pública
(total de dos mais de 2,19 milhões de brasileiros).
Segundo o Mapa das Ações Afirmativas, elaborado
pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro, em todos os estados
brasileiros há universidades adotando programas de cotas raciais ou sociais.
Repercussões
Para professores e
especialistas ouvidos pela reportagem, a revogação da portaria feita pelo MEC
tem caráter “simbólico”, mas é “inócua”. “As universidades têm autonomia
para tomar determinadas decisões e não precisam estar atrelada a uma portaria
do MEC”, lembra Nelson Inocêncio, doutor em artes, professor do Departamento de
Artes da Universidade de Brasília (UnB), um dos poucos docentes negros da
instituição.
“As universidades e
institutos não precisam do MEC para dar continuidade a essas políticas”,
concorda André Lázaro, ex-secretário de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade do MEC, hoje diretor de Políticas Públicas da Fundação
Santillana. Lázaro também é pesquisador da Flacso, onde editou a
coleção de estudos afirmativos. Em sua opinião, com a portaria o MEC “esvazia
seu papel de coordenar as políticas educacionais brasileiras".
Em nota, a reitora da
UnB, Márcia Abrahão Moura, assinala que “não haverá impacto prático da medida
na instituição”. A UnB foi uma das primeiras universidades a adotar políticas
afirmativas no país.
A reitora lembra que
recentemente a universidade aprovou política para ampliar a presença de negros,
indígenas e quilombolas nos cursos de mestrado e doutorado. “Serão destinadas
20% das vagas de cada edital para candidatos negros. Para indígenas e
quilombolas, será criada ao menos uma vaga adicional, para cada um dos perfis,
em todas as seleções dos programas de pós-graduação stricto sensu”. As regras
passam a valer para ingressos a partir do primeiro semestre de 2021.
Entidades que combatem
o racismo e defendem políticas afirmativas prometem entrar na Justiça para
sustar a portaria. Esse é o caso da Coalizão Negra por Direitos, que em
parceria com o Coletivo de Advocacia Estratégica em Direitos Humanos (Cadhu)
deve impetrar um mandado de segurança.
A associação Educação e
Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro) também promete entrar
com ações na Justiça até segunda-feira (22). “Seis medidas já foram
escritas por advogados voluntários”, informa Frei David, presidente da associação.
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