Empresas reclamam de dificuldade para prorrogar dívidas
Renegociação dependerá
das partes envolvidas, diz BC.
Por KELLY OLIVEIRA
da AGÊNCIA BRASIL,
Brasília/DF
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📷 Agência Brasil |
Empresas e pessoas físicas têm enfrentado dificuldades
para ter acesso à pausa de 60 dias no pagamento de parcelas de crédito,
anunciada pelos cinco maiores bancos do país. Empresas também reclamam de juros
mais caros em novas operações de crédito.
No mês passado, Caixa,
Banco do Brasil, Bradesco, Itaú e Santander anunciaram a prorrogação por até 60
dias dos vencimentos de dívidas para clientes pessoas físicas e micro e
pequenas. A medida não vale para cheque especial e cartão de crédito. A
renegociação de dívidas foi autorizada pelo Conselho Monetário Nacional.
O conselho facilitou a
renegociação de operações de créditos de empresas e de famílias que possuem boa
capacidade financeira e são adimplentes. A medida dispensa os bancos de
aumentarem o provisionamento (reserva de valor) no caso de repactuação de
operações de crédito que sejam realizadas nos próximos seis meses.
De acordo com o Banco
Central (BC), estima-se que aproximadamente R$ 3,2 trilhões de créditos possam
se beneficiar dessa medida. Na época, o BC disse que a “renegociação dependerá,
naturalmente, do interesse e da conveniência das partes envolvidas.”
Justiça
O advogado Márcio Casado
diz que os clientes com dificuldades de acesso à pausa no contrato podem
registrar reclamações nos Procons e ouvidoria do Banco Central, mas para ele a
medida mais efetiva é fazer um pedido de liminar na Justiça, com base no Código
Civil. Ele lembra que o artigo nº 393 do código define que “o devedor não
responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se
expressamente não se houver por eles responsabilizado”. “Houve modificações no
Código Civil, no ano passado, que permite a revisão de contratos, quebra de
contrato nas situações absolutamente fora da curva, inesperadas”, disse.
Segundo o advogado, há
casos de cobrança de juros quando se pede a prorrogação da dívida, e ele
acrescenta que “a lei não condiciona a exclusão da mora nesse período em que
configurada a força maior à eventual situação de adimplência do consumidor”. “A
oferta dos bancos necessita de uma análise de crédito, não é automática. Na
verdade o que eles estão fazendo é refinanciando e reexaminando o cadastro do
indivíduo. Quando o cliente consegue contato com o banco, não há margem de
negociação, só é possível fazer o que o sistema autoriza”, disse. Ele
acrescentou que já entrou com pedido de liminar para 10 empresas com dificuldades
de acesso à negociação.
Ele também critica o
prazo de 60 dias. “O período deve ser aquele em que perdurar o estado de força
maior. Ao que tudo indica o prazo mais razoável para o momento de crise que o
mundo vive deve ser de quatro meses”, destacou. O advogado acrescenta que essa
pausa no crédito deveria atender a todas as pessoas físicas e jurídicas que
necessitassem do crédito. Ele citou como exemplo motoristas por aplicativo, com
financiamento de carros, que podem ter dificuldades de pagar as parcelas,
devido à redução do número de passageiros.
Para entrar na Justiça,
Casado diz que as pessoas sem condições de pagar um advogado podem procurar a
Defensoria Pública, o Ministério Público e a assistência jurídica de faculdades
de Direito.
Juros mais altos
O setor de comércio e
serviços (mais de 5 milhões de negócios no país) enviaram no último dia 30 uma
carta ao Banco Central reclamando do aumento de juros do crédito para as
empresas. “Solicitamos atenção a despeito das medidas de injetar liquidez no
sistema financeiro nacional, pois observa-se o aumento expressivo das taxas,
com médias superiores a 50% e, alguns casos superiores a 70%, em operações
habituais do varejo, tais como de capital de giro, conta garantida, antecipação
de recebíveis, risco sacado, empréstimos 4131, entre outras operações”, diz a
carta aberta.
Em nota, a Federação
Brasileira de Bancos (Febraban) disse que as taxas de juros ficaram estáveis no
decorrer das últimas semanas, desde o momento que a crise atingiu o Brasil mais
severamente. “De forma geral, as taxas médias nas operações de varejo, tanto de
pessoa física como de pessoa jurídica, não registraram oscilações neste
período, tanto no caso das prorrogações, como para o varejo, que concentram a
imensa maioria dos clientes”, diz a nota.
Entretanto, segundo a
federação, nas operações novas e com grandes empresas, “às vezes, o cenário é
um pouco distinto, sobretudo com linhas mais longas.” “Isso ocorre porque o
custo de captação [dos recursos pelos bancos] aumentou substancialmente, mas,
neste caso, as operações de crédito envolvem grandes empresas, que demandam
volumes significativos de recursos, com impactos relevantes sobre a liquidez do
setor bancário. Além disso, os bancos internacionais cortaram as linhas que
dispúnhamos, o que estreitou mais ainda a liquidez do sistema”, acrescenta a
Febraban.
No último dia 23, o
presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse que o conjunto de medidas de
liberação de liquidez (recursos disponíveis no mercado) anunciadas até agora
pelo Banco Central chegam a R$ 1,2 trilhão. Na crise financeira internacional,
de 2008, o valor foi bem menor: R$ 117 bilhões.
No dia 26 de março, Campos Neto também afirmou que tem conhecimento de relatos
de aumento do custo do crédito. Ele disse que isso acontece por maior demanda
das empresas por determinadas linhas de crédito e também pelo maior risco de
inadimplência. “A crise pode gerar uma inadimplência maior e isso custa capital
para o banco”, afirmou, acrescentando que o BC está atento ao mercado de
crédito.
Na nota, a Febraban
afirmou que “as instituições financeiras trabalham com análise de risco de toda
economia, brasileira e mundial, e houve mudanças significativas nas últimas
semanas”. “As bolsas caíram fortemente de suas máximas históricas, o mercado
fez uma reavaliação geral nos preços dos ativos, o dólar foi para outro patamar
e a expectativa de crescimento do PIB brasileiro e mundial desabou”.
Nesse contexto,
acrescentou a Febraban, houve uma revisão do risco no país e no exterior. “O
mundo ficou mais arriscado. As medidas recentes do governo, via Banco Central e
Ministério da Economia, são, sem dúvida, muito bem-vindas e buscam justamente
endereçar algumas dessas questões, como liquidez. Mas, mesmo com essas
importantes medidas, a circulação de dinheiro ficou mais restrita”, destacou.
Bancos
O Santander informou, nesta sexta-feira (3) que os clientes
com parcelas de dívidas vencidas e não pagas desde o último dia 16 de março de
2020, ou que tenham prestações a vencer até 15 de maio, poderão ter o prazo
para o pagamento automaticamente prorrogado por até 60 dias, sem qualquer
acréscimo. Além da carência, o valor das parcelas será mantido inalterado até o
final do financiamento.
O Bradesco disse, em
nota, que não mudou política de taxas de juros para pessoas físicas e
jurídicas. “O banco trabalha com banda de taxas, que podem variar de acordo com
prazos, tipo de operação e risco, além de relacionamento e perfil de risco do
cliente”.
O banco acrescentou que
está à disposição para prorrogar por 60 dias as prestações de financiamento de
seus clientes. “A taxa de juros inicialmente contratada será mantida e haverá a
cobrança proporcional dos juros, considerando a carência solicitada, para o
período restante da operação. Podem prorrogar o financiamento, por até 60 dias,
todos os clientes que estiverem em dia com os seus pagamentos”, acrescentou o
Bradesco.
Para o pedido de
prorrogação do crédito pessoal, crédito parcelado, capital de giro e cheque
especial pessoas física e jurídica é necessário o cliente ligar para sua
agência e solicitar a pausa no contrato. De acordo com o Bradesco, o gerente
fará o ajuste necessário no contrato e disponibilizará uma nova proposta nos
canais digitais do banco (Internet banking, celular e autoatendimento), onde o
cliente fará a validação do novo contrato.
No caso do crédito
imobiliário, o Bradesco informou que disponibilizou um formulário em seu Internet Banking. Ele deve
ser preenchido, assinado e enviado por e-mail para
a agência do cliente. O gerente fará o ajuste necessário na prorrogação das
parcelas.
O Itaú Unibanco disse que
já prorrogou mais de 140 mil contratos de crédito para pessoas físicas e
jurídicas desde o anúncio da medida. São mais de 10 mil solicitações diárias,
passando por todas as linhas que fazem parte da ação (capital de giro,
empréstimo pessoal, crédito imobiliário e financiamento de veículos), disse o
banco. “Com essa opção, os clientes em dia podem prorrogar a próxima parcela de
empréstimos já em aberto por 60 dias, mantendo a mesma taxa contratada
inicialmente”, diz, em nota.
No último dia 19, a Caixa disse que reduziu o banco as taxas de juros de
linhas de crédito e ofereceu a pausa por até 60 dias para contratos de pessoa
física e jurídica, inclusive contratos habitacionais.
No final do mês passado,
o Banco do Brasil anunciou a liberação das operações de crédito para garantir a
liquidez financeira das micro e pequenas empresas. Esses clientes podem prorrogar as
próximas duas parcelas a vencer, que serão migradas para o final do cronograma
de pagamento de suas dívidas. Segundo o banco, a incidência dos juros será
diluída ao longo de todo o cronograma de pagamentos.
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